A banheira se foi, mas o legado permanece

Há anos recebi de presente da Dra. Alice Neves de Oliveira, membro da 1ª Igreja Batista do Rio de Janeiro um livro muito interessante.

Alice no país das velhas árvores é um desses livros chamados “autorais”. Livros autorais são aqueles produzidos pelos próprios autores e não tem objetivo comercial, mas apenas de contribuir para o enriquecimento cultural.

Dra. Alice escreve à neta Maria Fernanda várias lembranças de sua vida. Numa dessas reminiscências, lembra o caso da banheira.

Sua mãe, Dona Neném, como era mais conhecida, sempre sonhava em ter uma banheira para tomar seus banhos com mais conforto.

Seu pai, Sr. Luiz, crente piedoso e funcionário público, sempre foi um homem ético e ciente de seu dever em testemunhar do evangelho.

Certo dia, para surpresa de todos, é enviada à casa de dra. Alice, ainda menina, uma linda banheira francesa, novinha em folha.

O detalhe é que a tal banheira tinha sido oferecida pelo Secretário de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro, a qual o pai de dra. Alice era subordinado.

Sabendo da procedência do dinheiro de tal benesse, Sr. Luiz, obriga os mesmos funcionários públicos que transportaram a banheira, para que levassem de volta, dizendo: “coloque a banheira dentro do caixote e leve-a para onde veio. Esse presente veio de uma repartição pública e isso não pode acontecer. É dinheiro do povo e ninguém tem o direito de usá-lo em presentes”.

Dra. Alice conclui em seu livro: “Ele era cem por cento honesto. Não abria mão dessa honestidade e não se agredia. A admiração da mamãe se manifestou em seu silêncio. Ela o conhecia muito bem. Adeus banheira. Continuamos a tomar banhos de bacia, mas aprendemos uma grande lição de honestidade”.

A banheira se foi, mas o legado ficou. Hoje dra. Alice tenta passar para a neta esse patrimônio moral.

Legado não é o mesmo que herança. Uma herança pode ser útil para nossos descendentes, mas um legado é mais precioso. Uma herança pode ser desfeita numa crise econômica, num negócio mal feito, mas um legado fica guardado para sempre no baú de nossas memórias.

Que legado estamos deixando, como pais e maridos, para nossos filhos e netos? Será que os pais e avós de hoje estão deixando um legado de honestidade, de valores morais incorruptíveis?

Tive também o privilégio de receber um legado de honestidade de meu pai. Dono de uma gráfica, certa vez recebeu uma proposta para imprimir notas frias em trocas de uma boa quantia financeira. Não pensou duas vezes: disse um “não” bem sonoro para o proponente. Podia se justificar diante das privações financeiras que passávamos como família, mas preferiu deixar um legado a se corromper.

Precisamos de homens e mulheres que deixem esse tipo de legado aos descendentes. Se preocuparmos em transmitir esses valores aos nossos filhos e netos com certeza estaremos dando uma grande contribuição à nossa família e ajudaremos na construção de um pais sem, ou pelo menos, como menos corrupção.

Se tivesse aceitado a banheira, hoje ela não existiria mais. E nem história para contar. A banheira se foi, mas até hoje o legado permanece.

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Por: Gilson Bifano

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