Herança familiar no casamento

O que é herança familiar

Herança familiar são as características genéticas e culturais que recebemos de nossa família de origem, não somente de nossos pais, mas de nossos antepassados de três ou quatro gerações atrás. Isto é fascinante e misterioso, pois influencia nosso modo de viver  e até mesmo a forma como nos relacionamos com nosso cônjuge.

 Quando consideramos as características genéticas, além de todos os traços físicos, devemos incluir traços emocionais como, por exemplo, o temperamento. Uma criança já nasce com certo temperamento. Aqueles que têm mais do que um filho sabem  que eles são bem diferentes uns dos outros desde bebês. E no casamento o temperamento de cada cônjuge  pode determinar o tipo de relação que terão.

 A herança cultural é tudo que recebemos do meio ambiente: cuidados dos pais, abusos, educação de casa e da escola, ensinamentos religiosos,etc. E cada um de nós irá interagir com isto de uma forma muito particular pois Deus nos dotou de capacidade de escolher. Temos vontade própria. Assim vamos formando toda nossa memória através de nosso aprendizado. A questão emocional é vital neste processo.

Nossas escolhas são baseadas em nossos desejos conscientes e inconscientes. A escolha do cônjuge  é algo “perfeito”, tanto no que diz respeito ao positivo quanto ao negativo. O dito popular de que cada um tem o parceiro que merece pode ser verdadeiro. Por isso vemos histórias de casamento que se repetem. No dia do casamento os cônjuges juram que não querem repetir os mesmos erros dos pais, mas depois de alguns anos estão fazendo exatamente igual.

Porque podemos repetir os erros dos pais

Quando nos casamos levamos o que conhecemos para o casamento e também imaginamos que sabemos com quem estamos nos casando. Mero engano…. pois não conhecemos o outro e o que temos dele é uma projeção de uma imagem idealizada. Só com o passar dos anos é que vamos conhecer melhor nosso cônjuge, e muitas vezes nos surpreendemos ao descobrir como ele é parecido com nosso pai ou mãe.

Em meus atendimentos terapêuticos costume ouvir frases assim: “ – Como fui me casar com ele? Jurei a mim mesma que jamais me casaria com um alcoólatra (ou agressivo, ou infiel) como meu pai. Como fui repetir o mesmo erro? “.  E na medida em que a terapia vai avançando acabamos descobrindo o porquê, ou melhor dizendo,  o para que.

O caso dos  Maia

Carlos e Regina Maia vieram ao consultório numa tentativa de salvarem o casamento. Regina estava disposta a se separar, mas ele não. Carlos era um profissional liberal que tinha tudo para dar certo. No entanto era compulsivo por comida e gastos e bastante violento com a família. Sua vida financeira e profissional estava um caos.  Regina entrara num controle neurótico para equilibrar as finanças e defender os filhos da violência de Carlos. Os dois conheciam a graça de Deus, já haviam sido líderes em sua igreja e agora estavam num beco sem saída.

Na medida em que a terapia avançava fomos conhecendo suas histórias. O pai de Carlos também era violento e sua mãe submissa. O pai de Regina era alcoólatra e ela presenciou desde pequena as brigas entre os pais. Isso gerou nela um medo muito grande da violência, e quando se casou com Carlos ficava totalmente paralisada quando ele se tornava violento.

Carlos se tornou obeso e fez uma cirurgia para reduzir o estômago. Como não conseguia comer tudo que queria começou a beber demais. Um ano depois Regina se deu conta de que estava repetindo a mesma história de sua mãe. Lembrou-se que uma vez foram despejados da casa em que moravam porque seu pai não havia pago o aluguel mas tinha acabado de comprar um carro importado  zero que estava na garagem. Como pode cometer o mesmo erro?  Como foi se casar com alguém com problemas tão semelhantes ao do pai?

 Quando Regina conheceu Carlos tinha dezenove anos e estavam na universidade. Ele estava terminando sua formação. Apaixonados, davam o melhor que tinham um para o outro. Casaram-se e só mais tarde os problemas começaram vir à torna. Eles herdaram de seus pais os traços que geravam os conflitos em seu casamento. O medo paralisante de Regina era inconsciente. Só percebeu isso durante o processo terapêutico. A violência de Carlos apareceu no trato com os filhos, pois foi assim que foi tratado pelo pai. Essa violência foi crescendo na medida em que Regina não conseguia reagir.

O que fazer para mudar

 É possível evitar muitos conflitos no casamento com atitudes preventivas. No entanto isso não garante que não teremos problemas, pois não existe casamento perfeito.

 Os noivos poderão fazer um curso de aconselhamento pré-nupcial onde os líderes sejam capazes de detectar problemas em potencial. Se for o caso, poderão ser enviados a um aconselhamento ou terapia.

A melhor garantia para um casamento  duradouro é o compromisso que o casal assume diante de si mesmo, diante de Deus e da sociedade, baseado na graça e no conhecimento da Palavra. Assim, quando as dificuldades vierem, saberão que não estão sozinhos e que o mesmo Deus que não deseja a separação, dará também o livramento.

Quando as dificuldades chegarem, o casal poderá ver isso como uma oportunidade de crescimento . Para que a mudança aconteça é necessário transformar o modo de pensar, conforme Romanos 12:2 nos recomenda: “Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.

A primeira coisa que podemos fazer é reconhecer o problema. A segunda é aceitá-lo, pois não adianta ficar na negação ou condenando um ao outro. A terceira é renunciar a agir como de costume. No exemplo dos Maia, Regina tem aprendido a não ficar mais paralisada de medo. Com a ajuda da terapia tem conseguido confrontar com assertividade seu marido e corajosamente não se submete mais a seus abusos. Não pensa mais como uma criança apavorada, mas sabe que é uma mulher e que pode agir de forma diferente.  Regina mudou sua forma de relacionar-se com Carlos e isso provocou outra mudança nele. Diante dos confrontos que recebeu, Carlos começou a aceitar que tem um sério problema de compulsão: não consegue controlar sua raiva, sua alimentação nem seus gastos. Está aceitando sua impotência e sabe que perdeu o controle de sua vida. Está aceitando com humildade a ajuda da esposa, que tem procurado ajuda-lo na administração financeira. Os dois estão aprendendo a juntar suas forças ao invés de gastarem a energia numa guerra insana.

A formação de um casal único e singular

Embora a herança familiar influencie em nosso casamento, não precisamos continuar repetindo a história de nossos pais no que diz respeito a relações conflitantes. Podemos, no entanto, conservar os conteúdos bons que herdamos.  Meus pais viveram cinqüenta e quatro anos juntos e aprendi muitas coisas boas com eles e que procuro conservar em meu casamento.

No entanto, eu e meu marido também tivemos que aprender a formar um casal único e singular. Para que isto aconteça, deixo aqui algumas sugestões:

A. Respeitar as diferenças: além das diferentes de gênero, o cônjuge deverá aceitar que são indivíduos, portanto pensam, sentem e agem de forma diferente. Cada um traz uma história de vida e para formar o casal é necessário muita sabedoria e graça divina. A diferença não é defeito, é  só diferença.

B. Cooperar e não competir: quando aceitamos as diferenças individuais, podemos cooperar um com o outro. Estaremos somando nossas forças, enquanto que na competição estaremos nos destruindo.

C. Não comparar-se: nem ao cônjuge, nem ao casamento dos outros e nem ao casamento de seus pais. Assim poderão escrever sua própria história e realizar o mistério do casamento.         

Portanto, a herança familiar é a base sobre a qual construímos nosso casamento. Geralmente, as crises relacionais surgem quando percebemos que algo precisa mudar, mas estamos apoiados na cultura familiar recebida que, de tão influente, molda nossa identidade tanto como pessoas quanto como casal.

Ter que mudar implica em transformar nossa identidade, o que, obviamente, não é fácil. Porém, essas mudanças são necessárias, se quisermos que nosso casamento dure.

Isso lhe traz ansiedade? Pensar nessas mudanças deixa-o assustado? Não sabe qual caminho seguir? Ore: “Concedei-me, Senhor, a Serenidade necessária para aceitar as coisas que não posso mudar. Coragem para mudar as que posso e sabedoria para discernir a diferença.” 
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Por: Pisc. Elza Inácio Dias

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