A culpa é sua

A mulher brasileira tem alcançado algumas vitórias no que tange a sua inserção no mercado de trabalho e na prática de sua cidadania. Atualmente ela pode votar e ser votada, trabalhar, e ter direitos como a licença maternidade. Pode também estudar, ingressar na carreira militar, política, ou seja, ela é capaz de exercer atividades que há algum tempo atrás seria inconcebível. Entretanto, em meio a tantas conquistas ela tem enfrentado um terrível monstro chamado culpa que tem provocado a sensação de se estar perdendo o tempo todo. Se ela está em casa com os filhos, fica pensando no trabalho; se está no trabalho, pensa nos filhos; se as coisas não dão certo, na maioria das vezes ela introjeta um sentimento de que foi a culpada, e na verdade não é só ela que pensa isso, mas a sociedade reforça esse sentimento. Algumas frases que ouvimos por aí servem para ilustrar o que tem causado muita aflição na vida de algumas mulheres:

A culpa é sua porque engordou demais e seu marido a trocou por uma mais magra e mais bonita!

A culpa é sua se as crianças são rebeldes, sem educação, se comem demais se não se alimentam direito porque você resolveu trabalhar fora!

A culpa é sua se não consegue engravidar ou se seu marido está impotente porque na realidade você é que é infértil, ou não consegue ser sexy o suficiente!

A culpa é sua porque ficou cuidando muito dos filhos, deixou o marido de lado e ele carente, a trocou por outra.

A culpa é sua se seu filho se transformou num marginal ou se não vai á igreja!

A culpa é sua se sua filha está grávida porque você não prestou atenção no namoro dela!

A culpa é sua se foi estuprada porque afinal de contas, você não tinha que estar usando aquela blusa decotada!

Cercada por culpas vive a mulher que desejou pensar um pouco em si mesma, em suas necessidades e acreditou que conseguiria ser mãe, dona de casa, esposa, trabalhadora. A culpa parece estar em toda parte: família, igreja, sociedade. Todos esperam que ela seja uma espécie de mulher maravilha, que tenha um corpo escultural de anúncio de cerveja, que esbanje sensualidade mesmo quando está menstruada sofrendo horrores com cólicas terríveis, que tenha sempre vontade de ter relações com o marido, que nunca deixe o arroz queimar, que seus filhos sejam obedientes…

1) A culpa pela traição

A questão da traição é justificada até por outras mulheres que defendem que a mulher sábia edifica sua casa com eternas dietas e academia de ginástica e que o homens não precisam disso para manter acesa a chama da paixão. Eles podem engordar, ficar carecas, barrigudos…Francamente, é favorecer demais os homens! Vale a pena ressaltar que nem todas as mulheres que são traídas são gordinhas, feias, ou qualquer coisa do tipo. Além disso, existem homens que mesmo tendo relações sexuais com suas esposas procuram amantes. As motivações para a traição são muitas e as desculpas também. A mulher engole se quiser. Numa relação como o casamento, colocar a culpa, a responsabilidade da falta de sucesso em um dos cônjuges é inapropriado. Não se pode responsabilizar a mulher por algo que o marido fez e vive-versa.

2) A culpa pelo assédio

Assim como a traição, o assédio também faz parte das listas de culpas. Infelizmente ele reflete um problema do homem que violenta e não da mulher. Dizer que uma mulher é culpada porque desperta desejo é aceitar também que crianças e até mesmo bebês que são violentados têm culpa no cartório. A mulher pode estar vestida da cabeça aos pés e ainda assim ser estuprada. A Bíblia tem sido continuamente acusada de machista, mas ela diz que qualquer homem que cobiçar uma mulher comete pecado: ouvistes o que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela.( Mateus 5:27,28)

Devemos como mulheres cristãs ter sabedoria no agir, no vestir, no comportamento, devemos zelar por nossas condutas na sociedade, entretanto, não devemos nos sentir culpadas por todo tipo de assédio que nos cerca. Devemos até mesmo ficar atentas porque muitas crianças a nossa volta podem estar sendo violentadas sexualmente sem que nós imaginemos, mas sem nos sentirmos culpadas por isso. Algumas mulheres descobrem que seus filhos ou filhas foram molestados e ficam doentes e outras que não acreditam nas crianças. A omissão nesse caso, é um pecado, um erro muito grande, mas se as mães reconhecem que erraram e pedem perdão, elas precisam ser perdoadas.

3) A culpa pelo destino dos filhos

Em Ezequiel 18, vemos um texto que fala de um provérbio que era usado para dizer que a culpa dos pais cairiam na vida dos filhos:

Veio a mim a palavra do Senhor : Que tendes vós,  vós que dizeis esta parábola acerca da terra de Israel:Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram? Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, nunca mais direis este provérbio em Israel. Pois todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha. A alma que pecar essa morrerá.(Ezequiel 18:1-4)

Existem muitas mães que trabalham incessantemente para que seus filhos recebam uma ótima educação, deixam de comer para alimentá-los, dão o melhor dentro de suas possibilidades e mesmo assim seu filho se torna um marginal. A gravidez da filha adolescente também é algo cuja responsabilidade deve ser do casal porque ambos precisam estar atentos ao que acontece com ela.

Não somos seres onipotentes, nem tudo pode ser controlado por mais que nos esforcemos, o que é preciso entender é que existe algo que não se pode fazer e algo que se pode fazer: cuidar das crianças, ensinar, dar amor, carinho, corrigir, admoestar.

4) A culpa por não poder ser mãe

Às vezes o marido tem medo de ir ao médico e constatar que é estéril e coloca a culpa na mulher, entretanto, nem sempre é a mulher que não consegue engravidar, o problema pode ser do marido, ou até mesmo dos dois. De qualquer forma, não é uma atitude correta desprezar a mulher que não pode ser mãe, pois seu valor como pessoa supera a maternidade. Sendo assim, ela não deixa de ser mais digna ou amada por Deus porque não tem filhos. Além do fato óbvio de que ela não tem culpa de algo que não está ao seu alcance, de algo que ela mesma não pode mudar.

Por muito tempo foi sustentado um modelo de família que possuía uma dimensão sexual voltada para reprodução, ter filho era considerado um ato público, servia para mostrar para sociedade, ou seja, era uma demonstração de virilidade para o homem e fertilidade e fecundidade para mulher. O casamento ideal era de um homem de mais ou menos 30 anos, maduro, experiente e com capacidade para ser o provedor. A mulher deveria ser bem jovem, e biologicamente preparada para gerar filhos fortes e sadios.

Conclusão

Viver em sociedade não é tarefa fácil nem para o homem nem para a mulher. A mulher é cobrada o tempo todo. O homem também. Atualmente, muitas mulheres não querem mais ser sustentadas pelos maridos, e preferem, desejam compartilham o orçamento doméstico com seus maridos e ambicionam realizar-se profissionalmente sem que isso signifique perdas irreparáveis na relação com os filhos ou com o próprio cônjuge. De uma certa forma, nós estamos sempre perdendo e ganhando, quer sejamos homens ou mulheres. Algumas mulheres adiaram tanto a maternidade que quando quiseram ser mães não podiam mais e se arrependem de ter trabalhado tanto. Outras se arrependem de ter sido mães em tempo integral. E existem aquelas que reconhecem que tiveram de trabalhar e ser mães, mas que valeu a pena. Hoje os filhos cresceram, construíram suas próprias famílias, foram morar em outro país e elas não sentiram tanto porque possuem profissão, atividades, vida própria.

Existem mulheres que são obrigadas a trabalhar fora porque o que os maridos ganham não é o suficiente. Há também o caso de muitos homens que estão desempregados, cuidam da casa e suas mulheres trabalham fora. Todas essas transformações geram muitos comentários, críticas e fofocas do tipo: “ você viu? Fulana é que sustenta a casa enquanto o vagabundo de seu esposo fica em casa, onde é que esse mundo vai parar?!” Há também comentários do tipo: “fulana agora decidiu estudar e deixa as criança numa creche! Coitadinhas…”

Homem e mulher também são responsáveis pela casa e pela educação dos filhos. Ambos devem ir á luta para conseguir o sustento, para zelar pela paz na vida conjugal. Se o homem precisa participar das atividades domésticas, como a educação dos filhos, por exemplo, a mulher tem de saber uma profissão e trabalhar para ajudar seu marido ou para se realizar como pessoa.

Abandonar a culpa não é tarefa fácil. Se fosse fácil não existiriam tanta gente doente. Entender melhor a realidade que nos cerca, conhecer melhor, saber quem somos pode ajudar muito. Mas o mais importante mesmo é saber que temos um advogado, justo que nos ama e nos conhece como ninguém. Ele pode nos ajudar a ter uma vida sem essa culpa falsa, e com responsabilidade e maturidade para enfrentarmos e corrigirmos nossos erros. (I João 1:8-10)
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Por: Lídia Maria Teixeira Lima Coelho
Formada em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. Em Ciências Sociais pela Uerj. Cursa mestrado em Ciências Sociais pela Uerj.

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