Presentes ou Presença? A Lição Dolorosa do Mezanino

Outro dia, enquanto navegava pelo X (antigo Twitter), me deparei com uma postagem instigante.

Ela narrava a seguinte situação: um pai presenteou o filho com um carrinho. A criança, por alguma razão, rejeitou o brinquedo e o chutou. Diante disso, o pai pegou o carrinho, subiu ao mezanino da casa e, em um ato de fúria, o atirou no chão do andar de baixo, destruindo-o completamente.

O autor da postagem questionava seus seguidores sobre a atitude do pai: ela era aprovável ou não?

Parei para refletir um pouco sobre essa situação. À primeira vista, é possível até sentir alguma compreensão pelo pai decepcionado. Afinal, ele provavelmente comprou o carrinho com a intenção de fazer o filho feliz.

No entanto, ao analisar a cena com mais profundidade, outras questões surgem. Poderíamos nos perguntar: “Será que era esse o brinquedo que a criança realmente desejava, ou o pai o deu apenas para, quem sabe, suprir uma carência de sua própria infância?”. Ou ainda: “Será que a criança não estava, na verdade, precisando mais da presença do pai do que daquele presente caro?”. E, por fim: “Era realmente necessário aquele ataque de fúria, arremessando o carrinho do alto do mezanino na frente do filho?”.

Como pais, é fundamental agirmos com sabedoria em momentos assim. Talvez, naquele instante, o pai pudesse ter perguntado calmamente ao filho o motivo da rejeição ao brinquedo. Ou, ao invés de reagir com raiva, poderia ter conversado com a criança sobre a atitude dela e, a partir da rejeição, propor a doação do carrinho para outra criança que talvez o apreciasse mais.

A reação impulsiva de arremessar o brinquedo e estraçalhar totalmente o brinquedo não foi, na minha opinião, o caminho melhor. Lembro-me do que Tiago nos ensina em sua carta quando afirma “sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para se irar, pois a ira do homem não produz a justiça de Deus’ (Tiago 1:19-20). O pai, naquele momento, agiu movido pela ira, perdendo a oportunidade de ouvir o filho e buscar uma solução mais sábia.

Refletindo, ainda mais, sobre a atitude do pai e a sabedoria necessária em momentos assim, as palavras do apóstolo Paulo em Efésios 6:4 vêm à mente: ‘Pais, não irritem seus filhos…’. Será que a reação dele não acabou irritando ou desanimando a criança, ao invés de ensiná-la?

Por outro lado, é comum observarmos pais que presenteiam seus filhos com itens caros, muitas vezes para compensar a ausência em suas vidas. Será que, ao rejeitar o carrinho daquela forma, a criança não estava, de alguma maneira, comunicando essa carência ao pai?

A dinâmica de presentear crianças, hoje em dia, tornou-se um desafio complexo para muitas famílias. Basta visitar uma loja de brinquedos em qualquer shopping para constatar essa realidade.

Lembro-me, por exemplo, de um brinquedo que dei ao meu neto e que, se muito, foi usado três vezes.

Em uma viagem aos Estados Unidos, conversei com um pai que me relatou a enorme quantidade de brinquedos que seus filhos recebiam e que, no fim das contas, ficavam esquecidos. Realmente, muitas crianças hoje parecem “saciadas” ou até “enfastiadas” de tantos brinquedos. Na minha infância, a realidade era diferente; frequentemente, os brinquedos eram construídos por nós mesmos.

Diante disso, uma reflexão se faz necessária: ao presentearmos nossos filhos, qual é a verdadeira intenção por trás do gesto? Devemos pensar cuidadosamente no propósito de cada presente. O ideal é buscar itens que contribuam para o desenvolvimento da criança. Além disso, os presentes podem – e devem – ser uma oportunidade para fortalecer a união da família através do brincar junto.

E, por fim, um ponto crucial: nunca use presentes apenas como uma forma de compensar a sua ausência.


Por: Gilson Bifano
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Perguntas para você pensar:

1 – Considerando a reação do pai à rejeição do carrinho, como a gestão da frustração e da ira por parte dos pais pode impactar diretamente a forma como os filhos aprendem a lidar com suas próprias emoções e decepções?

2 – O texto sugere que a rejeição da criança pode ter sido um grito por algo além de um presente material. De que maneiras a ênfase excessiva em bens materiais pode mascarar ou até mesmo agravar a necessidade real de presença, atenção e conexão emocional entre pais e filhos?

3 – Refletindo sobre a prática de presentear na sociedade atual, qual é o propósito genuíno e saudável dos presentes para as crianças, e como podemos garantir que eles sejam ferramentas de desenvolvimento e conexão familiar, em vez de compensações por ausência ou geradores de “saturação”?

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